REFLEXÕES SOBRE SEGURANÇA PÚBLICA
"A bandidagem é que deve se sentir acuada, amedrontada e insegura".
Estamos vivendo um sentimento de insegurança nos nossos lares e percebemos nitidamente, que o mundo que sonhamos está sendo destruído por criminosos ousados, que matam, ameaçam, destroem o patrimônio público e privado, espalham o terror, afrontam o Estado e paralisam as cidades.
Poucos setores da vida política de uma cidade são tão suscetíveis a influxos polemizantes como o da segurança pública. Se o reconhecimento da criminalidade como uma ameaça iminente ao processo civilizatório é objeto de relativo consenso, o mesmo não se pode dizer com relação às causas e à natureza do fenômeno, nem tampouco às soluções agenciáveis para combatê-lo.
O dissenso nessa temática remonta já ao caráter real ou aparente da ascensão contemporânea da criminalidade, pois há quem interprete a atmosfera de pânico instalada no coração das grandes cidades como nada mais do que uma ilusão decorrente da "espetacularização" da violência, engendrada pela mídia e explorada por interesses escusos de governos e corporações, perspectiva popularizada pelo sociólogo Barry Glassner em sua obra "Cultura do Medo". O problema, nos termos desta concepção, seria menos de "insegurança" do que de "clima de insegurança", radicado talvez no fato de a vitimização estar alcançando estratos sociais com maior poder de verbalizar suas demandas.
Mas isto é assunto para "especialistas." O fato é que estamos vivendo um sentimento de insegurança nos nossos lares e percebemos nitidamente, que o mundo que sonhamos está sendo destruído por criminosos ousados, que matam, ameaçam, destroem o patrimÃ?nio público e privado, espalham o terror, afrontam o Estado e paralisam as cidades. A maioria das vezes os "especialistas" de plantão são candidatos ao Poder Legislativo, de olho no voto até o próximo pleito quando prometerão tudo de novo. Os "especialistas" ao longo de décadas não foram capazes de apresentar um projeto sério para a segurança pública, não se sabe se por incapacidade ou por dolo, para que os cofres públicos permanecessem a seu dispor. Convém lembrar que o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci) e a primeira Conferencia Nacion al de Segurança Pública (Conseg), foram iniciativas do Poder Executivo (governo Lula). Para ilustrar o não desejo de resolver o problema da segurança pública, podemos citar a crise provocada pela organização criminosa PCC no Estado de São Paulo, em 2006, quando o Ministro da Justiça Marcio Thomas Bastos disponibilizou cem milhões de reais para a segurança pública, ao então governador Cláudio Lembo e, este disse que era pouco. Mesmo assim, o governador não foi capaz de gastar a "ninharia" que retornou ao cofre da União por falta de projeto.
A primeira Conferência Nacional de Segurança Pública (Conseg) teve como um dos objetivos consolidar a segurança pública como um direito fundamental do cidadão e, para tanto, construir uma política nacional de segurança com a participação da sociedade civil, dos trabalhadores em segurança pública e representantes do poder público, apontando desta forma, para a necessidade de quebrar a barreira entre o "especialista e o leigo", "o fardado e os outros,"etc., e todos assumirmos a responsabilidade como preconiza a Constituição Federal.
Não podemos mais lidar com os criminosos organizados empregando os mesmos meios e métodos seculares empregados para combater a criminalidade comum ou eventual. Não seria exagero afirmar que convivemos com um quadro caótico nos meios policiais, onde as polícias não se reconhecem e cooperam pouco entre si, principalmente na área da inteligência policial; além disso, costumam discutir inutilmente competências e atribuições. Este quadro é agravado pela conhecida rotatividade dos chefes de polícia ou comandantes, seja a nível federal ou estadual. Esta situação requer uma ação rápida do poder público municipal que precisa suprir este hiato deixado pelo Estado. Não se trata de assumir o papel do ente federado estadual, mas de complementá-lo, já que a Constituição Federal não autoriza a criação de uma polícia municipal como seria desejável, mas diz que segurança pública é direito e responsabilidade de todos e também estabelece que eficácia é dever do Estado (prover os meios) e eficiência é dever do servidor.
Coube a esta Secretaria Municipal de Segurança Pública, por determinação do Excelentíssimo Senhor Prefeito elaborar um projeto de policiamento comunitário, superando assim a primeira fase, a do patrulhamento comunitário.
O Governo Municipal em parceria com o Governo Federal fez investimentos importantes na área social nos últimos anos, principalmente nas regiões mais pobres. Sem estes investimentos não seria possível formular uma política pública de policiamento comunitário, pois os pobres que vivem em áreas degradadas costumam confiar menos no poder público que lhes nega serviços públicos fundamentais como educação, habitação e saúde, por exemplo.
A cultura do crime só é quebrada quando a sociedade se torna uma aliada da polícia local, principalmente da Guarda Municipal que é subordinada ao poder municipal que atende seus serviços públicos fundamentais.
É indispensável que a Guarda Municipal que serve de ponte entre as forças policiais, esteja próxima da população e em parceria, porque não há nada mais eficaz para controlar uma comunidade que ela própria.
A eficiência da polícia comunitária é muito difícil de mensurar porque o trabalho de cada guarda é discricionário. Pode haver guardas com característica de só prender pessoas e não investigar mais nada, outros preferem orientar e obter informações de pessoas envolvidas em diversos casos, evitando dessa forma problemas maiores no futuro. No segundo caso ninguém toma conhecimento e nem figura em estatísticas, mas o ganho social é imenso.
O modelo brasileiro de segurança pública enfrenta muitas dificuldades porque as decisões são tomadas longe das pessoas que vivem nas cidades e não nos Estados Federados. Além do mais, herdamos do colonialismo português o modelo de persecução criminal a partir do inquérito policial que só existe no Brasil onde as polícias Federal e Civil são as polícias judiciárias da União e do Estado, respectivamente; restando às outras polícias e guardas municipais o papel de meros coadjuvantes, já que não realizam o ciclo completo, nascendo daí a desmoralizante impunidade brasileira. Só para citar um exemplo, um estudo atual realizado pelas maiores universidades brasileiras, encomendado p ela Federação Nacional dos Policiais Federais, aponta que apenas dezesseis por cento dos homicídios cometidos no país, levam a denúncia. Convém lembrar que o homicídio é um dos crimes mais fáceis de investigar.
O único critério para medir a eficiência dessas polícias é baseado nas taxas de aprisionamento, que apesar da sua importância, pode não ser o mais justo. A verdadeira resposta sobre a eficiência policial vem da comunidade que se sente mais segura quando a incidência de crimes cai.
É de domínio público que em qualquer lugar do mundo os crimes são cometidos por um número pequeno de indivíduos e que a reincidência é muito grande, principalmente nas áreas de fronteiras de países onde o sentimento de impunidade é maior. É relativamente fácil cometer crime em um país e em poucos minutos estar em outro, fora do alcance da justiça. A reincidência de crimes, que não é privilégio desta cidade, está alicerçada no moribundo sistema prisional brasileiro, que além de não recuperar os criminosos, permite que eles continuem comandando os crimes de dentro das cadeias através das visitas íntimas, sem tirar o mérito dos advogados pombos-correio. É imperativa a supressão desses privilégios.
Ora, se os criminosos são poucos, como afirmamos acima, parece óbvio que as forças de segurança têm o dever de conhecê-los. Para tanto, se faz necessário um SERVIÇO DE INTELIGÊNCIA MUNICIPAL objetivando a obtenção, análise e produção de conhecimentos de interesse da segurança pública, sobre fatos e situações de imediata ou potencial influência da criminalidade, atuação de organizações criminosas, controle de delitos sociais, assessoramento às ações de polícia judiciária e ostensiva por intermédio de análise, compartilhando a difusão de informações.
É de se salientar que as organizações criminosas sediadas nos grandes centros urbanos mantêm nesta região seus representantes locais, sejam eles criminosos comuns, servidores públicos corruptos ou empresários de fachada. É desnecessário dizer que os altos lucros com o contrabando, falsificações, tráfico de drogas, armas e munições, entre outros ilícitos, sustentam a cadeia violenta que atinge todo o país. Portanto, não seria exagero afirmar que pela localização geográfica de Foz do Iguaçu, somente a União, Estado e Município, atuando de forma integrada poderão controlar a porta de entrada de ilícito, responsável por grande parte da violência que assola todo o país.
O Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), do Ministério da Justiça, aplica recursos diretamente no município para o combate a violência, sinalizando assim, para a descentralização da segurança pública; indubitavelmente dividindo com o município essa responsabilidade e, ainda mais, exige a criação de um Gabinete de Gestão Integrada Municipal (GGIM) que é presidido pelo prefeito. Nada mais sensato, pois é o poder executivo municipal que tem de dar resposta aos anseios da população e não o governo estadual ou federal à distância.
O policiamento comunitário que estamos executando nas doze regiões de Foz do Iguaçu teve início há mais de um ano quando o Prefeito e o Ministro da Justiça firmaram o convênio do PRONASCI e, em seguida, o Departamento Técnico da GM elaborou o projeto, que depois de aprovado pelo Ministério da Justiça, deu início a capacitação de todo o efetivo da Guarda Municipal nos cursos de Polícia Comunitária, entre outros. Fazem parte deste projeto o Grupamento de Operações de Trânsito (GOT) e Grupo Tático de Apoio (GTA) que tem papel fundamental no combate a violência e, finalmente, a criação do Núcleo de Inteligência da SMSP com o objetivo de colaborar na busca de provas e informações nos procedimentos investigatórios, gerenciar e atualizar o banco de dados da criminalidade, analisar ocorrências atendidas pela GM, relacionar-se com os órgãos de inteligência policiais e as secretarias municipais, acessar o banco de dados nacional (INFOSEG), manter o quadro operacional da GM informado, propor ações ao setor de planejamento operacional e, ainda, exercer em conjunto com outros órgãos policiais, a atividade de análise de inteligência na central de monitoramento de câmeras que em breve serão instaladas na cidade. É oportuno dizer que os guardas que operam o Núcleo de Inteligência foram formados pela Agência Brasileira de Inteligência (ABIN).
Todavia, as experiências de polícias comunitárias em todos os países que a adotaram, só tiveram êxito onde a polícia ou guarda e comunidade teve total apoio dos outros serviços públicos; daí a indispensável integração com todas as outras secretarias municipais. Só assim teremos um policiamento proativo.
Convém lembrar que policiamento comunitário não é apenas o policiamento preventivo que poderia ser interpretado pelos criminosos como um policiamento frouxo. Ao contrário, novas e maiores agressões a coletividade devem gerar ações de maior intensidade e eficácia. Justamente para isso, o GTA foi criado e treinado, para atuar tanto na prevenção como na repressão uniforme aos mais diversos delitos em conjunto com as forças policiais. No entanto, quando se fala do Estado firme e justo, as mudanças são bloqueadas por uma concepção desmedida e facciosa dos chamados direitos humanos, do que resulta formidável proteção aos facínoras, como se fossem os únicos titulares de direitos humanos ilimitados. Por exemplo, a presunção de inocência só tem gerado uma desmoralizante impunidade, com os recursos especiais e extraordinários meramente protelatórios que eternizam o processo; como também o direito de permanecer em silêncio e de esquivar-se à auto-incriminação que é "confundido" com o direito de mentir. O direito não briga com a ética. Quem cala não pode ser punido por isso, mas quem mente está dificultando ou impedindo o regular funcionamento da justiça, ensina o doutor em direito do Estado Adilson Abreu Dallari.
O limite maior aos direitos dos facínoras está nos direitos humanos das pessoas de bem, que trabalham, pagam impostos, geram empregos e produzem bens e serviços essenciais para o bem-estar da coletividade, ou seja, têm deveres sociais cuja inobservância, mormente gera sanções. Esses é que devem ter o direito de ir e vir com segurança e usufruir os bens adquiridos com o trabalho honesto. O poder público tem o dever de garantir esses direitos. O governo tem o dever de usar a força para evitar o crime e segregar do convívio social os que atentam contra a segurança das pessoas honestas. No confronto direto, na resistência, a Guarda Municipal em conjunto com as forças policiais tem o dever de ganhar do delinquente.
Para combater a criminalidade organizada e violenta, a Guarda Municipal precisa estar capacitada, organizada, equipada, dispor de maior força e poder utilizá-la. Barbárie é a criminalidade incontrolada. A hora é agora. É preciso que as coisas mudem: A bandidagem é que deve se sentir acuada, amedrontada e insegura.
Foz do Iguaçu, março de 2011
Adão Luiz Souza Almeida, Secretário Municipal de Segurança Pública do município de Foz Iguaçu e policial federal por 30 anos, aposentado.
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